11 maio, 2013

Um tratamento pouco ortodoxo

por Fernando Gurgel Filho
Dizem que um grupo estava acampado no mato e um deles, com fama de medroso, perguntou para o guia, meio índio, se ele conhecia algo contra picada de cobra, escorpião ou outro bicho peçonhento.
"Ah, num tem pobrema, não, dotô, a gente aprocura um pedaço de bosta e faz um chá pra tomá. Num sara, não, mais segura o veneno até chegá no hospital”, respondeu o guia.
O medroso não se conformou:
"Ê, matutada. Essas crendices matam mais que a própria cobra."
À noitinha, todos deitados, uma parte do grupo resolveu aprontar com o medroso. E forjaram uma picada de cobra no coitado.
Ele deu um salto da rede gritando: "Socorro, socorro, socorro!... A cobra me mordeu!".
Quando todos acudiram, ele, quase desfalecido, suplicava: "Pelo amor de Deus, façam um chazinho de bosta. Rápido que meus olhos tão ficando embaçados."
E arrematou, apavorado:
"Me deem logo um pedacinho pra eu ir chupando, enquanto o chá fica pronto!".
Medo não é brincadeira, não. Mas a piada vem no rumo da ciência, que já descobriu uma indicação terapêutica para essa matéria-prima. Não como "tratamento" das peçonhas em geral, mas para o efetivo tratamento de uma forma grave de diarreia. Trata-se da infusão por sonda nasoduodenal de fezes, digamos, saudáveis para o tratamento da infecção recorrente pelo Clostridium difficile.
Veja aqui.

Link para o artigo original no prestigioso The New England Journal of Medicine.

Um comentário:

Paulo Gurgel disse...

Transcrevo e-mail recebido:
Dr. Paulo, parabéns pelas mudanças efetuadas no texto irônico que fiz.
Mas tinha uma razão para escrever daquela forma.
Vi a matéria numa revista da Editora Globo, a Época Negócios, que minha filha assina: http://epocanegocios.globo.com/sumario.html
A matéria chama-se Copiando a flora intestinal alheia que, infelizmente, está acessível apenas para assinantes.
Neste artigo, o autor dá ênfase ao problema que os idosos têm com a tal bactéria que, segundo ele, estão presentes em crianças, mas que não as afetam tanto. Segundo entendi como leigo, essas bactérias tornam-se problemáticas à medida que a idade avança. É a tal diarreia recorrente nos idosos.
Daí o texto no formato meio debochado, mas que foi magistralmente refeito por uma pessoa que entende do assunto: Dr. Paulo Gurgel.
Grato e um grande abraço,
Fernando Gurgel