17 abril, 2017

A descoberta da praia

Édouard Manet
Até o século 18, a beira-mar não era um lugar que as pessoas fossem para relaxar. Nos tempos antigos, era onde você podia correr o risco de ser atacado por monstros marinhos como Cila e Caríbdis, piratas sanguinários ou mesmo pegar a varíola. Então, algo mudou. O historiador da Universidade de Sorbonne Alain Corbin explora esta história incomum no livro "The Lure of the Sea: The Discovery of  the Seaside in the Western World, 1750-1840" (O Fascínio do Mar: A Descoberta da Praia no Mundo Ocidental, 1750-1840), uma das fontes para um artigo fascinante na revista Smithsonian sobre a "invenção da praia":
Por volta de meados do século 18, de acordo com Corbin, as elites europeias começaram a divulgar as qualidades curativas do ar fresco, dos exercícios e dos banhos de mar. Especialmente na Grã-Bretanha, onde aristocratas e intelectuais estavam preocupados com a própria saúde. Eles viam os trabalhadores, nas fábricas e novas cidades industriais, com a destreza física reforçada através do trabalho. Em comparação com estes, as classes economicamente superiores pareciam frágeis e decadentes. A noção do "mar restaurador" nascia. Médicos prescreviam um mergulho em águas frias para revigorar e animar. O primeiro resort à beira-mar foi aberto na costa oriental da Inglaterra, na pequena cidade de Scarborough, perto de York. E outras comunidades costeiras surgiram para atender uma clientela cada vez maior de banhistas, que procuravam tratamento para uma série de condições: raquitismo, lepra, tuberculose, gota, impotência, problemas menstruais, melancolia e histeria. Em uma versão anterior da cultura de bem-estar de hoje, a prática de banhos de mar havia entrado para o mainstream.
Descrevendo esta reviravolta notável do "despertar irresistível de um desejo coletivo para a costa marítima", Corbin conclui que, em 1840, a praia passou a significar algo novo para os europeus. Tornou-se um lugar de consumo humano; um cobiçado "escape" da cidade e do trabalho penoso da vida moderna. A ascensão da indústria e do turismo facilitou este processo cultural e comercial. A viagem tornou-se acessível e fácil. e famílias da classe média buscavam a costa em números cada vez maiores. "On the beach" (na praia), no jargão dos marinheiros, em vez da conotação de desamparo (ser preso ou deixado para trás), agora transmitia saúde e prazer. E o termo "vacation" (férias), antes utilizado para descrever uma ausência involuntária no trabalho, era agora um interlúdio desejado. (PGCS)

Inventing the Beach: The Unnatural History of a Natural Place (Smithsonian)

The Lure of the Sea: The Discovery of the Seaside in the Western World, 1750-1840 (Amazon)

Um comentário:

Unknown disse...

Interessante.Nao tinha ideia! Parabens pelo texto. Nos faz pensar como muitos dos nossos habitos vem sendo moldados pela sociedade de consumo.